- 1.014 mil mortes de crianças indígenas de zero a quatro anos de idade
- Segundo relatório, as mortes poderiam ser evitadas
- AM é o segundo estado brasileiro que mais matou indígenas em quatro anos, com 163 homicídios
O Amazonas (AM) é o estado brasileiro com maior número de óbitos de crianças indígenas nos anos de 2019 a 2022, com 1.014 mil mortes na faixa etária até quatro anos de idade. No ano passado, 233 óbitos foram registrados, e 2019 foi o ano mais letal, com 273 falecimentos.
Durante os quatro anos, no Brasil, foram registrados 3.552 mil mortes, e o AM representa 25,5% desse total. Os dados constam no Relatório Violência Contra Povos Indígenas no Brasil, lançado nesta quarta-feira (26) pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) em Brasília (DF).
As mortes dessas crianças, segundo consta no relatório, poderiam ter sido evitadas, uma vez que, conforme os levantamentos, ocorreram por desassistência no âmbito da atenção à saúde, imunização, diagnóstico e tratamento adequado. Em 2022, de acordo com os dados da Sesai compilados no documento, o AM teve 24 óbitos de indígenas por falta de assistência, sendo um total de 132 mortes nos últimos quatro anos, o que coloca o estado em segundo lugar em nível nacional para esse parâmetro
“Registramos a morte de idosos e crianças da Terra Indígena (TI) Vale do Javari. Em Atalaia do Norte, famílias Kanamari que se deslocaram à cidade para buscar serviços e acessar benefícios sociais, perderam duas crianças. A situação de insalubridade e vulnerabilidade extrema nos locais onde estavam hospedadas contribuiu decisivamente para a morte das crianças. As estadias costumam durar semanas, durante as quais os indígenas permanecem ‘acampados’ nas embarcações, à beira do rio, sem nenhuma assistência”, consta no documento.
O filósofo e missionário Roberto Leigbott, um dos organizadores do relatório, aponta que o genocídio indígena fazia parte do plano do governo Bolsonaro. Para ele, todos os dados apresentados no documento fazem parte de um roteiro bem elaborado pelo governo passado, cujo resultado final era a morte dos povos indígenas e tomadas de terras, como quase ocorreu com a etnia Yanomami, revelado nacionalmente em janeiro de 2023.
“Nesses quatro anos, foram 3.552 mil crianças que morreram. É muita criança que deixou de viver. E isso tem que parar. Esse relatório fecha um ciclo da perversidade e de brutalidades. No governo do inominável (sic) havia um roteiro programático do genocídio, que começa com a desterritorialização dos povos como acesso às demarcações das terras. A segunda parte do roteiro é a desconstrução de tudo. A desassistência e vulnerabilização dos povos indígenas fazia parte do roteiro”, declarou Leigbott.
ASSASSINATOS
Outro dado alarmante coloca o Amazonas entre os primeiros da lista: homicídios. Segundo o relatório, o AM é o segundo estado brasileiro que mais matou indígenas nos últimos quatro anos, com 163 homicídios no período de 2019 a 2022. A lista é liderada pelo estado de Roraima, com 208 mortes, e na terceira posição está Mato Grosso do Sul (146). No ano passado, 30 indígenas de etnias distintas, sendo 11 mulheres e 19 homens, foram mortos. O ano mais letal para os povos originários no estado ocorreu em 2019, com 49 mortes registradas.
“Ao longo dos quatro anos, Roraima (208), Amazonas (163) e Mato Grosso do Sul (146) mantiveram-se como os três estados com maior número de assassinatos registrados. Juntos, os três estados concentraram 65% dos homicídios praticados contra indígenas no período”, analisa o documento, que cita o caso da jovem Sherry Mylena Kokama, de 18 anos, vítima de feminicídio no município de Tabatinga (distante 1.108 quilômetros da capital) pelo ex-companheiro, Jonas Correia da Silva, 25 anos.
Jonas Correira da Silva e Sherry Milena Kokama (Foto: Reprodução)
O crime ocorreu em 14 de janeiro de 2022. Sherry Kokama, natural de Santo Antônio do Içá, era uma jovem liderança indígena em Tabatinga. Ela estava indo para Manaus com o filho de cinco anos, e Jonas, por não aceitar o fim da relação, cometeu o ato criminoso. Segundo testemunhas, o ex-companheiro esperou a jovem chegar na embarcação para atacá-la com vários golpes de faca. Ela não resistiu aos ferimentos e morreu no local. Jonas está preso e deve responder na Justiça pelo crime de feminicídio.